Saúde na UTI

À espera de solução para próteses e órteses

Centro de Reabilitação Física de Bagé ficará sem prestador de serviço nos próximos dias; com atrasos no pagamento, empresa Ortopédica Canadense garante que não renovará contrato

Carlos Queiroz -

Pacientes de 39 municípios da Zona Sul e da região da Campanha, que aguardam a colocação e o uso de próteses e de órteses, ficarão sem perspectiva de receber o atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

O Centro de Reabilitação Física de Bagé (na região da Campanha, a 189 quilômetros de Pelotas) segue como referência às cidades, mas nos próximos dias estará sem prestador de serviços que permita acolher novos casos. A empresa Ortopédica Canadense, de Porto Alegre, confirmou ao Diário Popular: com os repetidos atrasos nos repasses do governo do Estado, não renovará o contrato. A dívida, acumulada entre os meses de fevereiro, março e abril, ultrapassa os R$ 100 mil.

Uma reunião nesta terça-feira (30), na capital, colocará o tema em pauta. "Teremos mais informações no decorrer da semana." Foi o que a Secretaria Estadual de Saúde se restringiu a afirmar, no começo da tarde desta segunda, via assessoria de imprensa. O titular da 3ª Coordenadoria Regional de Saúde (CRS) em Pelotas, Gabriel Andina, assegurou não ter recebido informações sobre a iminente interrupção do contrato nem sobre a paralisação do atendimento. "Não recebemos nada; nem por parte do Estado nem do prestador de serviço."

Em contato com o coordenador adjunto da 7ª CRS, Carlos Magno Cesarino, o DP também ficou sem posicionamento oficial das soluções que estão por vir para evitar prejuízos à população.

Receio e poucas palavras
Ao receber o Diário Popular, na manhã de quinta-feira, a coordenadora do Serviço de Reabilitação Física, Simone Irenio, garantiu desconhecer qualquer definição quanto ao futuro do contrato, que chamou de um possível descredenciamento. A fisioterapeuta também preferiu não comentar nenhum detalhe sobre a liberação de verbas e sugeriu que a equipe de reportagem recorresse ao secretário de Saúde de Bagé, Mario Mena. "Para nós, as datas que eles vão vir para semana de avaliações, geralmente em início de mês, estão definidas até o final do ano", afirmou a coordenadora.

Decisão tomada
A sócia-proprietária da Ortopédica Canadense, Roseli de Souza Menezes, assegura: a posição está fechada.

A empresa não irá renovar o contrato, ainda que o governo do Estado quite a dívida superior a R$ 100 mil. "Isso já aconteceu outras vezes, mas em seguida o governo atrasa de novo. É uma decisão tomada. Temos tido muitos transtornos financeiros", lamenta e refere-se aos juros bancários e à relação com fornecedores que elevam a pressão para ter os pagamentos em dia. Sem falar na tabela do SUS, com valores defasados há anos.

Daqui para frente, a empresa se compromete apenas em entregar as próteses já negociadas; sejam situações de ajuste ou aquelas em que as provisórias ainda dependem de substituição pela definitiva. Para evitar pendências, neste mês já não ocorreram medições para novas encomendas.

Sorriso dá lugar às lágrimas
Não falta entusiasmo. O pelotense Jadir Lucena Nobre, 49, sorri fácil. Em um bate-papo de uma hora, revela superação. A amputação de parte da perna esquerda, há cerca de dois anos, não foi o suficiente para lhe arrancar a alegria. Cercado de atenção de familiares e de amigos, esbanja criatividade para se manter ativo.
Pedaladas até o Laranjal, com adaptação nos pedais. Jogos de bola com os netos, agora como goleiro.

Motivação para treinar os times de futebol amador, que tanto ama. "Eu não desanimo. Não paro. Não dá para desistir", ensina. Mas quando o assunto envereda para as sessões de fisioterapia realizadas no Serviço de Reabilitação Física, Nobre altera a expressão. O sorriso largo dá lugar às lágrimas, ao lembrar dos dramas de outros pacientes com quem tem convivido em Bagé. "Tem muita gente que precisa daquele Serviço e o pessoal de lá trabalha com muita vontade. Vai ser uma pena se parar", resume, ainda sem data para colocação da prótese.

Um orçamento chegou a indicar quanto a família precisaria arrecadar para não depender do SUS: cerca de R$ 7 mil. A certeza de que precisaria de acompanhamento e de ajustes na prótese fez desistirem da ideia.

Não bastariam campanhas e rifas. É preciso de atendimento especializado - destaca, em coro por solução.

Afinal, os sonhos não param. Um dos próximos é uma festa-baile para celebrar os 50 anos e dançar. Sim, ele faz questão de dançar. São decisões, sutis, que tornam o dia a dia mais leve. "A tragédia fica para lá. Nunca nos faltou uma palavra de aconchego", enfatiza a mulher, Rosângela, 55. O acidente de moto, as oito cirurgias para tentar recuperar a perna esquerda ao longo de quatro anos e a amputação ficam no passado. "A vida anda. Vamos em frente."

Mais autonomia
A aposentada Idinara de Moraes, 62, enfrenta a expectativa pela prótese do pé esquerdo, amputado em consequência do diabetes. "Mas ainda não tirei as medidas. Fico ansiosa sem saber o que vai acontecer", admite, ao concluir mais uma sessão de fisioterapia. Uma etapa, essencial, em busca de mais independência.

A palavra dos secretários de Saúde 
- Em alerta - A secretária de Saúde de Pelotas, Ana Costa, afirma que o tema deve entrar na pauta de reunião técnica interna, marcada para esta terça, com representantes da 3ª Coordenadoria Regional. A preocupação é de que os pacientes não fiquem sem atendimento. "Estamos acompanhando o assunto e atentos à questão da desassistência."

- Sem retorno - O Diário Popular ficou sem a posição do secretário de Saúde de Bagé, Mario Mena. Na tarde de sexta-feira, veio a informação do gabinete: "Por telefone, o secretário não fala com jornalista". Na quinta-feira quando o DP estava em Bagé, entretanto, também não conseguiu contato com Mena. Para falar diretamente com o secretário, teria de ser pela manhã. "Na quinta, o doutor faz cirurgias na parte da tarde. Por isso, não se encontrava na secretaria."

Saiba mais
O Serviço de Reabilitação Física de Bagé é referência a 39 municípios, de três Coordenadorias Regionais de Saúde

- 3ª CRS: 22 cidades
População: 845.135 - Censo 2010
Amaral Ferrador, Arroio do Padre, Arroio Grande, Canguçu, Capão do Leão, Cerrito, Chuí, Cristal, Herval, Jaguarão, Morro Redondo, Pedras Altas, Pedro Osório, Pelotas, Pinheiro Machado, Piratini, Rio Grande, Santa Vitória do Palmar, Santana da Boa Vista, São José do Norte, São Lourenço do Sul e Turuçu.

- 7ª CRS: 6 cidades
População: 182.579
Aceguá, Bagé, Candiota, Dom Pedrito, Hulha Negra e Lavras do Sul.

- 10ª CRS: 11 cidades (*)
População: 465.038
Alegrete, Barra do Quaraí, Itaqui, Maçambará, Manoel Viana, Quaraí, Rosário do Sul, Santa Margarida do Sul, Santana do Livramento, São Gabriel e Uruguaiana.
(*) Apenas os pacientes que já possuem vínculo com o Serviço de Bagé permanecem em atendimento. Casos novos passaram a ser encaminhados à cidade de Santa Maria.

- Quem se beneficia do Serviço de Reabilitação Física?
As Secretarias Municipais de Saúde decidem quem será encaminhado a Bagé, conforme a demanda e o total de vagas, definido com base na densidade demográfica de cada um dos municípios - explica a coordenadora do Serviço, Simone Irenio. A equipe, em Bagé, sequer teria conhecimento da lista de pacientes que aguardam atendimento.

- Tipos de serviços - Além das próteses e órteses, o Serviço de Reabilitação Física também é referência a cadeirantes.
As cadeiras de roda, entretanto, não dependem das negociações com a Ortopédica Canadense. O contrato é com outra empresa e não se encerra neste momento.
Em média, 25 próteses e 40 órteses (bengalas, coletes, calçados...) são entregues por mês; informa a Ortopédica Canadense.

- Pacientes novos - 70 avaliações para receber novos casos são feitas por mês - considerados todos os serviços prestados.

- Atendimentos - Os números variam bastante. No mês de abril, por exemplo, 387 atendimentos foram realizados; visto que os pacientes se mantêm em acompanhamento, em geral, semanal.
Até estarem em condições de fazer uso de próteses, por exemplo, os pacientes passam por sessões de fisioterapia para investir em cuidados, como o fortalecimento da musculatura e o equilíbrio.

- Equipe - 14 profissionais - 11 fisioterapeutas, 1 médico ortopedista, 1 coordenadora e 1 responsável pelo setor administrativo.

 

 

 

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